sábado, 20 de março de 2010

Mini conto 04-arquivo


O gerente


Fez carreira no Banco estrangeiro, começou como boy- hoje é gerente. Casou, há três anos, com uma funcionária. Dorme um na sala, outro no quarto- já nem lembra a razão da separação, pelo desprezo dela, hoje, acredita que queria mudar da favela para o bairro nobre. Isto não o aborrece, só o mutismo que tomou conta dos dois.
Acorda ao amanhecer, gosta de ouvir os pássaros na mata próxima, sente-se pleno, inspira ar puro, sonha.

A mãe mora na esquina. Ele toma o café da manhã lá, vai para o Banco, volta para a casa da mãe, toma banho, janta e volta para casa.
A mãe, mulher forte e implacável, foi abandonada pelo marido quando ele era muito pequeno: “Aquele miserável perdeu tudo que tinha com mulheres, desgraçado”, diz todos os dias. Difícil esquecer a fome e humilhação que passou. Ele não tem raiva do pai, mal lembra, a mãe diz:”Igualzinho, tal pai, tal filho”. Não estudou, o dinheiro não deu, só o irmão virou doutor.

“Você é um incapaz, nem mulher conseguiu prender, merece o chifre que deve estar levando, aposto como ela tem outro, ninguém gosta de homem frouxo”, “Só chegou onde chegou graças ao seu irmão, este sim, é competente”.

Mesmo assim não sai da casa materna. Nos fins de semana fica à beira da piscina, que o irmão construiu, até que se canse da cantilena e o sol se ponha.
Está velha, a mãe. Anda com dificuldade, mas faz questão de fazer os pratos do mediterrâneo.

Domingo último, agora, estava tomando uma cerveja quando ouviu um barulho surdo de queda, seguido de um grito da mãe.
O coração bateu acelerado, sentiu calafrio, mas as pernas pesadas ficaram como estavam, recostadas na cadeira de piscina. Na cabeça, a mãe dizia em cantilena: ”Incompetente, igual ao pai”.

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